segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira


Fiquei surpreso com a notícia de que uma associação de deficientes visuais está preparando um protesto, no dia da estréia do filme “Ensaio Sobre a Cegueira” nos EUA. Segundo a matéria, veiculada no “GLOBO” no último dia 28 de setembro, a associação considerou ofensivo o tratamento dado à cegueira no filme de Fernando Meirelles. Quero deixar claro que sempre apostei no protagonismo dos movimentos sociais e considero legítimos os questionamentos do grupo americano. Só não concordo com o argumento de que são ofensivas e desrespeitosas as questões levantadas sobre a cegueira no filme. Sendo assim, coloco as seguintes questões:

Por que um protesto somente contra o filme e não contra o livro de José Saramago, que vendeu milhões de exemplares e do qual foi adaptado com absoluta fidelidade, o filme?

Será que o enfoque dado à cegueira foi devidamente compreendido? Uma cegueira que ultrapassa o físico e avança em direção ao simbólico?

O argumento de que há um cego de nascença, com atitudes éticas questionáveis, desqualificam todos os cegos? Ainda nessa lógica, o fato de ser cego garante que o indivíduo seja coerente e ético?

Estas são questões com as quais me deparei quando li esta notícia.


O filme de Fernando Meirelles é simplesmente maravilhoso. Um soco no estômago, eu diria.
Em uma cidade não identificada começam a ocorrer casos de uma cegueira inexplicável, aparentemente contagiosa e que se manifesta através de uma nuvem leitosa. Os atingidos pela “cegueira branca”, identificados, são imediatamente encarcerados pelo Estado repressor em um espaço sem nenhuma estrutura. Nessa jornada, a mulher de um médico acometido pela repentina falta de visão, consegue romper o cerco do isolamento, sendo a única pessoa a enxergar, no grupo de cegos que aumenta a cada dia. Com o passar do tempo, afloram nesta estrutura improvisada e segregadora, os instintos mais animalescos. As necessidades básicas não satisfeitas fazem emergir os sentimentos mais obscuros e que, em condições normais, são encobertos pela civilidade gerenciada pelo “superego”.
O livro e o filme conseguem dar a exata dimensão de nossos limites éticos, diante das necessidades mais elementares de nossa existência. A fome, os preconceitos, os medos, a insegurança, o ódio, a cobiça... Estas são algumas das mazelas com as quais se depara nesse universo saramaguiano, tão próximo de nós. Até que ponto a cultura consegue escamotear nossos instintos soterrados em uma suposta civilidade? Será que em nosso dia-a dia, não criamos estratégias que encobrem atitudes animalescas e instintivas, porque justificadas por discursos oficiais religiosos, filosóficos ou científicos? E que, por isso mesmo, são legitimados em nosso dia-a dia? O fato é que a crise moral que se abate sobre os cegos de Saramago é uma crise que se observa na esfera do comum, do familiar... do banal. Por isso choca. Exatamente, porque nos identificamos com ela. A arte proporciona isto. A ficção se torna um espelho que quebraríamos, se fosse possível, por ser doloroso e difícil de se digerir, quando se reconhece nele, nosso próprio reflexo. A cegueira metafórica expressa no filme nos submete (ou deveria nos submeter) a um exame reflexivo de nossas atitudes diárias com o outro e, conseqüentemente, com nós mesmos, na medida em que existimos, também, a partir do outro. Mas nem tudo está perdido. A cegueira também é capaz de fazer com desperte o sentimento de humanidade. O sofrimento pode provocar o sentimento de alteridade. De se colocar no lugar do outro. A partir da dor dos outros, como diria Susan Sontag, podemos reconstruir nossa trajetória. Compreendo todos estes limites, não só por meio de nossas motivações individuais ou subjetivas, mas como parte de um sistema cruel, que aposta no individualismo, como fonte de sobrevivência de um capitalismo feroz e avassalador. Ensaio Sobre a Cegueira deixa claro que a solução reside no coletivo, ainda que devamos respeitar as individualidades.

domingo, 21 de setembro de 2008

Feijoada Imperial, samba, amigos e cerveja...combinação perfeita!


Samba, feijoada e cerveja sempre são uma ótima combinação. Eu pelo menos adoro! Conectadas com esse contexto borbulhante (como diria meu amigo Ney Flávio), as escolas de samba já começaram a temporada de feijoadas pré-carnavalescas. Tudão!!! Ontem fui à Feijoada Impérial, que simplesmente me proporcionou uma das melhores noites de minha vida (sem exagero!!). Além da boa feijoada da Tia Néia, a galera é super receptiva e oferece um mix legal de pessoas, que só poderia terminar em samba de boa qualidade, com os grupo Só Preto Sem Preconceito, Senzala, Toninho Gerais e a bateria frenética de Mestre Átila. Eu adoro o Império Serrano, apesar de ser portelense. A escola da Serrinha, durante muito tempo foi meu point, numa fase em que freqüentava Madureira direto. Foi na época em que morei em Realengo e me acabava ao som dos agogôs mais famosos do carnaval carioca.
Sabe aquela tarde/noite onde tudo é perfeito! Pois é... foi ontem! Juntos, dando nos cadeirões no camarote, estavam pessoas tão diferentes, mas com um único objetivo: se divertir pra caramba. E foi isso que fizemos!!! Claro que a anfitriã da noite, minha amiga poderosa Silvia, top das tops, foi fundamental!!! Silvia recebe como ninguém e esbanja simpatia por todos os lados. Ela consegue administrar beleza, simpatia e simplicidade como ninguém. Valeu Silvinha!!
Além de tudo isso, consegui a oportunidade de reencontrar uma galera que não via fazia um tempão e que amo pra caramba! Só isso já valeria a ida ao Império. Mas o reencontro superou todas as minhas expectativas. Foi simplesmente uma fusão perfeita, de pessoas super divertidas. A cerveja gelada,vinda em baldes de gelo, foi uma ótima solução da escola para suprir a sede do povo que lotou a quadra da Edgard Romero! Bebi horrores!!! Mas o que me emocionou mesmo, foi ter conhecido Tia Maria do Jongo da Serrinha, figura ilustre, não digo nem do Império, mas do Brasil e que ficou um bom tempo com a gente no camarote. Só quem trabalha com o resgate e manutenção da cultura negra nesse país sabe como é difícil desenvolver projetos nessa área. E isso Tia Maria faz com muita dignidade e como poucos. Aliás, dignidade é uma coisa que essa guerreira exala por todos os poros. Simpática, tirou da bolsa um álbum de fotos que é uma preciosidade, mas que, nem de longe, exprime a importância que ela tem pro Brasil e pra todos que, através do jongo, conseguem mostrar o que de melhor representa nosso país. Aliás, eu disse isso para ela!!! Morro tranqüilo agora! Depois fui com uma galera pro Coração de Mãe, ao lado do Madureira Shopping. Apesar de ter acabado a luz (!), este pagode estava lotaaaaado! Seguindo a ferveção, claro, fomos pra rua da Portela rir mais um pouco e dá-lhe mais cerveja e o clássico podrão de fim de noite! É... Madureira continua mandando!!!! Salve Madureira!!!! Salve a amizade!! Salve o samba!!!!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Reflexões sobre o acesso ao trabalho


Foi numa mesa de bar que um grande amigo me disse que não achava o trabalho humano tão importante assim. Eu que acho que o trabalho continua sendo central na vida humana e que sempre gosto de levantar uma polêmica, ainda mais com amigos, iniciei um debate ali mesmo. Mas como se tratava de uma confraternização, achei que não convinha continuar a celeuma, pois sempre corre-se o risco de sermos indelicados em algum momento. E indelicado é uma coisa que me esforço para não ser. Por isso resolvi escrever este post, que parece meio fora de contexto. Puro desabafo!!! Esse é pra você Steffan. Segura!!
Sempre desconfiei do discurso oficial (leia-se governamental) de que os índices de desemprego estão caindo. Cheguei à conclusão, depois de muito queimar a mufunfa e refletir sobre o assunto, que o discurso não estão de todo errado. Pior. Está tremendamente equivocado. O principal instrumento do qual dispõe os órgãos de medição dos níveis de desemprego em qualquer lugar do mundo é... a procura por emprego. Ou seja, se muitas pessoas procuram emprego, a taxa de desemprego é alta. Seja uma busca nos órgãos governamentais ou nas milhares empresas de RH espalhadas pelo mundo. O problema é que as pessoas não estão procurando emprego porque estão trabalhando. O que não significa que estejam empregadas. Quando digo empregadas quero dizer, trabalhando com e sob determinadas garantias trabalhistas. De proteção social mesmo. Aquelas que garantem o que já estamos carecas de saber e nem sempre usufruir: carteira assinada, FGTS, férias, décimo terceiro, desconto de INSS, vale transporte, etc, etc, etc. Na verdade um grande contingente não está empregado. Não tem vínculos trabalhistas que lhe permitam gozar destes direitos historicamente conquistados. Antes, estão inseridas em um mercado de trabalho informal, precarizado, temporário. Que de tão precário, não permite que paguem sequer o INSS, nem na forma de contribuinte individual, a antiga autonomia. Isso é barra!
No caso do Brasil estas pessoas, homens, mulheres e crianças, são vítimas de uma modernização tardia de processo de industrialização (também tardio), cuja reestruturação produtiva exige um alto grau de conhecimento de tecnologias, cuja maioria das pessoas, principalmente as de gerações mais antigas, não tiveram a chance de acompanhar e portanto não dominam. São excluídos, tanto por uma questão geracional (os mais velhos têm mais dificuldades de arrumar trabalho, isso é fato), quanto por não conseguir acessar tecnologias de ponta exigidas pelo concorrido mercado de trabalho. Mas a exclusão não se resume aos mais balzaquianos. Os mais jovens (digo os jovens pobres) também têm tido dificuldades de alcançar os requisitos admissionais de empresas que exigem, além de um acesso à educação formal, habilidades cada vez mais complexas, tanto na indústria, como no setor de serviços. Neste último, a absorção da mão de obra se dá de uma forma ainda mais cruel e onde vamos encontrar uma saga de desprotegidos como camelôs (a Uruguaiana não me deixa mentir), as trabalhadoras domésticas, os vendedores autônomos (Avon, Natura, etc), e toda uma gama de trabalhadores e trabalhadoras que, por estar minimamente ganhando o mínimo para sua subsistência, não vão gastar dinheiro de passagem para se candidatar à postos de trabalho cuja resposta, provavelmente será negativa. Ouvir NÃO o tempo todo cansa, penso eu. Eu cansaria. Além disso, o discurso que domina o (escasso) mercado de trabalho é aquele que exalta o empreendedorismo como vantajoso (seja seu próprio patrão!). Diante disto, o melhor de fato, segundo o discurso da moda, é partir para atitudes empreendedoras que dissimulam uma falsa liberdade, que na realidade se transforma em fortes dores de cabeça quando, por algum motivo, não se pode trabalhar (os casos de doenças são típicos) e não se pagou o INSS. Trabalhar para si mesmo envereda por um caminho tortuoso que, não raramente, acaba com o tempo livre a que todos tem direito. Perde-se a noção do que é trabalho e o que é lazer ou descanso (se é que há descanso!). No caso das mulheres, esta situação é ainda mais cruel. Geralmente ocorre uma dupla jornada de trabalho, que faz com que as mulheres acumulem atribuições historicamente imputadas ao sexo feminino (como cuidar da casa, dos filhos, marido, dos mais velhos), com atividades (mal) remuneradas. A flexibilização das leis trabalhistas foi o tiro de misericórdia em cima de uma população sofrida e cuja desculpa esfarrapada, tenta nos fazer acreditar que trabalhadores têm o mesmo poder que patrões em uma mesa de negociação salarial. Tudo isso diante de grande crise sindical, com sindicatos (vide a CUT e outras centrais sindicais), que foram cooptados pelo governo. Mentira quando se fala que a flexibilização das leis de proteção de trabalho vão gerar mais emmprego! Todos sabemos que o enorme contingente de reserva que está por aí, necessitando de trabalho, está pronto para assumir trabalhos em condições ultrajantes por pura necessidade. Pronto Steffan! Estou aliviado!

domingo, 14 de setembro de 2008

Velho Casanova...


Confesso que o fim do Cabaré Casanova como espaço exclusivamente GLS me pegou de surpresa. Não sou o tipo saudosista, nem acho que tudo é para sempre. Mas o cabaré foi singular na minha vida e me sinto na obrigação de render uma homenagem, ainda que singela, a este espaço tão significativo, já que não vi nenhuma manifestação do gênero. Fiquei realmente triste, apesar de há muito tempo não freqüentar a casa de som e público eclético e democrático. Me parece que este fim precoce e sem sentido caracteriza também o fim de uma era. Sei perfeitamente que a casa, que sempre gozou de prestígio entre seu público alvo, também sofreu, paradoxalmente, com a revitalização da Lapa e sua transformação em espaço descolado. Afirmo que se trata de um paradoxo, pois esta revitalização, ao invés de incrementar o cabaré, diluiu sua clientela em outros espaços, não necessariamente GLS, agora tão em moda na nigth carioca.
O Casanova foi um espaço histórico e de inegável resistência da comunidade gay no Rio de Janeiro. Numa época em que não se falava em direitos civis de gays, lésbicas e todo o arco-íris, lá estava o velho “Cabaré” transgredindo padrões de comportamento, inclusive em plena ditadura militar. Juntava em seu vasto repertório humano e musical diferentes tendências e preferências. Talvez na região central do Rio, os espaços mais significativos tenham sido, além do próprio Cabaré, o famoso Boêmio´s, que fechou as portas em 1998 e que foi agora transmutado definitivamente, penso eu, em restaurante natureba. Reza a lenda que, quando ainda era “Bifão”, a casa recebeu uma das mais promissoras transformistas da noite gay carioca, mas que já havia passado pelo concorrido fervo da Lapa, antes de uma rusga com a estrela da casa, Marlene Casanova. Tratava-se de Laura Clayper, que mais tarde, não sei porque cargas d’agua, viria a se transformar no furacão Laura de Vison (ou mamãe parabólica!). Assim, o público que circulava democraticamente pelas duas casas podia ver, tanto os shows escatológicos de Laura, na escada mais famosa do Rio, quanto as dublagens suburbano-glamurosas de Meime dos Brilhos e suas convidadas. Ganhava o centro. Ganhava o mundo gay e lésbico. O auge das duas casas, afirmam pessoas com as quais conversei e viveram intensamente aquela época, foi o que se caracterizou pela correria das estrelas transformistas, para dar conta de apresentações nas duas casas concorrentes, de exibições realizadas no domingo anterior no Show de Calouros do Silvio Santos. Estrelas como Angélica Ravache, Erick Barreto e Andréa Gasparelli eram as divas da dublagem nacional, antes da hegemonia do bate-cabelo (ataque epilético como diria Suzy Brasil), que tem no palco da paulistana Blue Space sua maior expressão. No outro extremo desse Rio mágico, na zona sul carioca, o carão ficava por conta das apertadas e pseudo-sofisticadas “Sótão” e "Le Jardim" da Galeria Alasca. Ah! As poderosas também circulavam pela descolada “Papagay”, na Lagoa, para ver as incríveis performances de um cast especializado em shows andróginos. O mais engraçado é que quase todos/as freqüentavam as boates do centro, mesmo que nas rodinhas da “bolsa” de Copa, bem em frente ao Copacabana Pálace (a Farme era apenas um tímido projeto de point gay) negassem de pés juntos tal possibilidade (Deus é mais, deviam dizer as mais indignadas!).
Tavez o grande mérito do Casanova tenha sido o fato de ter sobrevivido a uma Lapa ainda marginal e povoada por travestism, não menos marginalizados e descendentes diretos da mítica Madame Satã. Era a Lapa de uma malandragem perigosa, mas meio inocente diante do que conhecemos hoje. Uma Lapa que atraía, ao final da noite, os velhos camburões que, não raramente, observavam com atenção o público bêbado e feliz da vida, que saía da casa . Não sei... mas tenho a impressão que o tiro de misericórdia do Casanova, que recebeu espetáculos de Carlos Machado em sua época de ouro, tenha sido, não somente os botecos mudernos da Lapa, mas o agressivo marketing do “pague pouco e beba todas”, iniciado pelo cult “Buraco da Lacraia” e similares. O velho Cabaré, provavelmente, não suportou a concorrência. Uma pena. Fica aí o relato e a tristeza de uma pessoa que, apesar de não ter vivenciado tantas estórias da casa, vê no seu melancólico encerramento o fim de uma era de boates com shows divertidos, pretensamente glamurosos, mas precursores da arte da dublagem no Brasil. Mas como nada é pra sempre mesmo, vamos esperar e ver o que nos reserva os anos que vêm por aí. Valeu Cabaré!!

sábado, 13 de setembro de 2008

Viagem à Curitiba...


Eu não conhecia Curitiba. Confesso até que tinha uma certa resistência em conhecer essa cidade. Papo vai, papo vem, alguns amigos me diziam coisa impublicáveis da capital do Paraná. Coisas tipo: gente antipática, cidade asséptica, povo etnocêntrico. Coisas assim... Como rolou uma boa oportunidade de participar de um evento na cidade resolvi enfrentar a resistência e fui. Mas confesso que não investiria dinheiro algum em me aventurar pela cidade, antes de conhecê-la, ainda mais com as (péssimas) referências que obtive. Sabe como são os amigos... implacáveis. E certamente diriam, caso eu odiasse a cidade: não te falei!!!! Odeio ouvir isso!

Curitiba I


Uma semana na cidade já me permite algumas observações. Espero não estar sendo injusto, mas prometo me retratar, caso mude de idéia ou me convençam do contrário. A cidade de Curitiba é funcional. Só isso já valeria como pretexto para visitar aquela que é considerada a capital nacional da qualidade de vida. Quase tudo funciona. Desde o sistema de transporte (pagam-se modestos R$ 8,00 por um confortável ônibus que sai do Aeroporto e deixa próximo à maioria dos hotéis), até a variedade de restaurantes (concentrados em sua maioria no bairro de Santa Felicidade zona gastronômica de Curitiba). O povo curitibano é bastante gentil (ao contrário do que me diziam) e capazes de gestos surpreendentes, como de um senhor que vendo que eu e uma amiga não estávamos conseguindo um táxi, se mostrou solidário informando o ponto mais próximo, sem que tivéssemos pedido. Achei 1000. E não foram só estes gestos. Todos sabem que a maior referência turística de uma cidade são os motoristas de táxi. Em Curitiba não é diferente. Com uma diferença. Tive a impressão que são extremamente honestos e cordiais. Existe uma tal de URBE, que gerencia o transporte público e treina os profissionais. Só este esforço já vale um tremendo elogio à administração da cidade. Mais isso não é coisa de uma gestão. Fica claro ser um acúmulo de boas iniciativas, que fizeram da cidade uma capital funcional e LIMPA, é bom que se diga. Os pontos turísticos são outro forte da cidade. Nada que se compare ao Rio de Janeiro, mas tive boas surpresas. Se pagamos R$ 16,00 podemos circular pela cidade em um confortável ônibus de turismo, com direito a quatro paradas (os ônibus convencionais custam R$1,90). Tudo isso com uma voz em off que resume, em alguns minutos, em português, espanhol e inglês, a história do lugar ou ponto turístico. Se não tiver saco pra usar todos os tickets em um só dia, pode deixar para o dia seguinte. No problem. Ponto pra cidade!
O ápice da viagem foi sem dúvida o passeio de trem pela Serra do Mar descendo 976 metros a partir da rodoferroviária de Curitiba. Por modestos R$ 28,00 fiz uma viagem (em classe econômica) maravilhosa, de quatro horas, e que me proporcionou momentos inesquecíveis. Com direito à guia e tudo. A viagem de trem nos leva até o município de Morretes a 10 m de altitude. Trata-se de uma cidadezinha que já foi um importante entreposto de alimentos, mas que com o processo de industrialização da capital e o crescimento do turismo ecológico viu sua importância reduzida ao turismo. Mas acho que basta. A pequena cidade parece cumprir bem essa missão. No caminho para Morretes, ainda no trem, percebe-se um tímido mas crescente processo de favelização (que o guia chamou equivocadamente de urbanização!) às margens da ferrovia. Típico sinal de que cabem aos pobres as zonas mais periféricas e sem estrutura alguma. Viajando no trem, nem parece que nossa Mata Atlântica está à beira da extinção. O pouco que sobrevive, às custas de projetos ambientais corajosos é simplesmente exuberante. A cidade não me pareceu cara e há uma boa rede hoteleira que supre de maneira eficiente a fluxo de turismo na cidade. Recomendo visitar a Catedral de Nª Srª da Luz (onde assisti uma linda missa em homenagem à padroeira da cidade), a Ópera de Arame, o centro histórico e o museu Oscar Niemeyer, onde vi exposições maravilhosas de Tarsila do Amaral e da história da cardiologia no Brasil. Ah... não deixem de visitar os parques da cidade. Curitiba tem uma área verde invejável. Foi muito bom ver crianças e velhinhos passeando pelos parques, nos raros momentos de sol que presenciei na cidade que me ofereceu nove graus de temperatura.

Curitiba II




Acho que fui fofo com a cidade, não fui? Mas Curitiba me alertou para uma coisa que já desconfiava. O conceito de qualidade de vida é da ordem do particular. Do subjetivo. Portanto é relativo. É necessário frisar, portanto, que falo de um lugar específico. Sou carioca. E como todo carioca vi frustradas algumas expectativas em relação à cidade. A nigth por exemplo. Não sou exatamente um boêmio, mas adoro conhecer as baladas alheias. Constatei nessa tentativa que Curitiba não é exatamente uma cidade boêmia. Essa fama deve continuar, merecidamente, com Rio e SP. A night é sofrível, é bom que se diga. E se pretende sair, o eficiente sistema de transporte verificado durante o dia não valerá para a noite. Prepare-se pra desembolsar a grana do táxi. As bebidas não são caras. Paguei R$ 3,00 pela latinha de cerveja (Kaiser) na SPM, boate localizada no centro da cidade e lotada de teenagers. O show é meia bomba e com o velho bate-cabelo em versão curitibana. Mas elas se esforçam e conseguem divertir. Pelo menos o termômetro, a platéia, aprovou e aplaudia a cada crise epilética das artistas. Preparem-se para se deparar com bons restaurantes, mas que fecham às 11 horas da noite, em pleno Santa Felicidade. Corram, senão ficam sem jantar. Não me avisaram e quase dormi com fome, ou então (caso não encontrasse um restaurante quase fechando), seria obrigado a migrar para o outro lado da cidade, o centro histórico, onde seria obrigado à comer petiscos. Sabe o porque de minha frustração? Trata-se de uma cidade que anuncia ter Rua 24 horas (fechada para obras!), uma Boca Maldita (que remete à ferveção mas calmíssíma pro meu gosto), mas que é... provinciana!!
Um motorista de táxi me resumiu bem o temperamento do curitibano... São educados, mas fechados. Coisa de quem, provavelmente, se acha o brasileiro mais europeu do Brasil. Portanto, não adianta. Vou continuar procurando nights agitadas, gente mais abusada e boemia aonde quer que eu vá! Quando não encontrar, vou considerar o lugar simplesmente funcional!